Cristãos sírios lidam com a perda e o trauma

Cristãos sírios viajaram da Síria para um país vizinho, para participar de um curso de apoio ao trauma, promovido pela Portas Abertas que, desde 2008, está envolvida no apoio à Igreja síria
Uma longa lista de perdas e traumas revela o que os 18 participantes do grupo estão sofrendo ou o que eles têm testemunhado em sua vizinhança. Vítimas de ataques violentos, eles sentem com medo do futuro, fracos na fé e já não são capazes de pensar e expressar seus sentimentos.
"No primeiro dia eu me senti realmente muito seguro por estar aqui", disse Hadi * um jovem de 23 anos, "mas, no meio do dia, meu irmão me ligou e me falou de um morteiro que havia caído muito perto de sua casa. Então eu comecei a me preocupar e me sentir culpado por estar aqui e não com eles."
Além do trabalho de assistência social e distribuição de cestas básicas, a Portas Abertas também apoia a Igreja síria com suporte espiritual para lidar com o trauma. O objetivo deste curso é capacitar os participantes, de modo que isso os ajude em sua situação pessoal, e no possível, aplicar as lições aprendidas em conjunto com outros cristãos em suas igrejas ou nos pequenos grupos, quando voltarem para casa.
Durante o primeiro dia, Amran expressa suas preocupações e compartilha: "Eu me pergunto se é conveniente levar as pessoas para fora do país, para um ambiente seguro e então enviá-las de volta. Porque eu sei que vou ser enviado de volta para o perigo em poucos dias. Isso poderia criar um trauma ainda maior para mim."
A maioria do grupo parece discordar de Amran. "Eu já fiz dois deste tipo de treinamento", diz Ihram, um participante com cinquenta anos de idade, "e pode parecer terrível voltar em poucos dias, mas eu tenho certeza de que você agradecerá por esses poucos dias e por ter sido aliviado de todo o estresse. Aproveite esses dias e respire livremente".
Uma jovem, de 19 anos, confirma isso: "Nossa igreja, às vezes, proporciona às pessoas irem para uma aldeia distante dos arredores de Damasco onde ainda é seguro. Eu sei que tenho de voltar para casa, mas ainda assim, eu me sinto revigorada por poder participar. É um momento para, de fato, esquecer a guerra e pensar em coisas normais de novo".
Durante o curso, o discipulador traçou paralelos com a história de José, da Bíblia. "A vida de José estava cheia de decepções. Ele quase perdeu sua vida, foi traído por seus irmãos, perdeu sua liberdade, perdeu sua nação, perdeu sua família, perdeu sua reputação por causa da esposa de Potífar, foi esquecido por seus amigos da prisão. Mas Deus restaurou tudo na vida de José. José diz: "Vocês planejaram o mal contra mim, mas Deus o tornou em bem", Deus está no negóciopara mudar as coisas da escuridão para a luz e para restaurar a nossa vida".
Ghaffar, de vinte e poucos anos, diz: "Uma coisa que eu aprendi é que muitas pessoas têm algum tipo de trauma. Eu tinha a ideia de que somente quando alguém perdesse um membro da família é que ficaria traumatizado, mas todos os que vivem em uma zona de guerra sofrem de traumas em diferentes níveis e necessitam de cura de alguma forma."
Em uma situação de perda e trauma, um sentimento de amargura ou vingança está à espreita. O discipulador explica sobre Jesus que é o maior exemplo de perdão e diz: "Embora humanamente seja muito difícil perdoar, o perdão libera o agir de Deus em sua vida. O castigo e a vingança pertencem a Deus que sabe o que é melhor. O perdão não quer dizer que a ofensa não tenha importância ou que você não tenha sido ferido. O perdão não significa que a confiança seja restaurada e não garante que a ofensa não aconteça novamente".
Durante o curso os participantes também foram desafiados a expressar seus sentimentos de esperança para a Síria, de forma criativa. Com meios limitados os formandos criaram belas obras de arte, transmitindo as situações atuais em que vivem, mas também a esperança que eles têm para o futuro de seu país. As fotos e legendas falam por si.
Ihram: "Nós aprendemos como manter a esperança interior e aprendemos comodesenvolver uma boa conversa e também a ouvir as outras pessoas." Alguém acrescenta: "Eu trabalho muito com crianças, mas eu não sabia como trabalhar com elas e lidar com estas questões. Eu aprendi muito agora, embora eu sinta que poderia aprender muito mais, ainda, sobre como lidar com crianças e jovens traumatizados".
"Um dia, havia um homem-bomba em nosso banco. Todo mundo entrou em pânico, mas pela graça de Deus, eu pude permanecer calma", diz Hasna, uma mulher de 30 anos. "Embora, agora, eu me sinta mais preparada para lidar com estas situações eu sei que eu tenho de ouvir mais as pessoas e não impedi-las de falar."
Também Amran, que expressou suas preocupações anteriormente, está feliz porque teve a chance de participar. "Há tantas maneiras de aprender a lidar com pessoas que têm trauma, espero aprender ainda mais formas, isso é muito útil."
*Os nomes utilizados neste artigo não são reais para proteger a identidade dos participantes.
FontePortas Abertas Internacional

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